Prefeituras como de Mossoró, Parnamirim e Pau dos Ferros promoveram festas populares com cachês de até R$ 1 milhão, mas, os gestores municipais reclamam de crise financeira culpando a queda nos repasses do FPM. Em Mossoró, salários estão ameaçados
Por César Santos – Jornal de Fato
Entre o fim de agosto e o início deste mês de setembro, a Prefeitura de Pau dos Ferros gastou recursos públicos na contratação de mais de 10 atrações musicais para shows na Praça de Eventos, dentro da Finecap 2023. A prefeita Marianna Almeida (PSD), que é vice-presidente da Federação dos Municípios do Rio Grande do Norte (FEMURN), engrossa o grito dos gestores municipais por mais recursos federais para atenuar a queda nos repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
Marianna repete o discurso do prefeito de Mossoró, Allyson Bezerra (União Brasil), que alarmou recentemente ao admitir que os salários dos servidores podem ser atrasados em setembro, culpando a “queda” do FPM, embora o município acumule aumento em torno de R$ 4 milhões entre janeiro e agosto deste ano em relação ao mesmo período de 2022.
Allyson, assim como Marianna, não economizou nos gastos com festas populares. Entre junho e julho, o prefeito promoveu três grandes eventos: Cidade Junina, Sal & Luz e a Festa do Bode, que juntos somaram mais de 100 atrações musicais nacionais, regionais e locais. Os custos dos eventos não são de conhecimento público, uma vez que a gestão municipal não apresenta a prestação de contas, mas estima-se que a Prefeitura de Mossoró gastou mais de uma folha salarial dos servidores só que essas três festas.
O que ocorre em Mossoró e em Pau dos Ferros se repete em outras dezenas de cidades, como Parnamirim que no fim de agosto pagou cachê no valor de R$ 1 milhão ao cantor sertanejo Gusttavo Lima, que se apresentou na “Festa do Sabugo”. Mesmo assim, os gestores reclamam que as prefeituras estão “quebradas”, com serviços básicos ameaçados, porque houve queda nos valores dos FPM nos últimos meses de 2023.
Verdade, ou não, o fato é que prefeitos e prefeitas potiguares se somam ao movimento organizado pela Confederação Nacional dos Municípios (FPM) por uma participação maior dos municípios no bolo da União. O principal ponto da pauta é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 25/2022, que altera o art. 159 da Constituição Federal para aumentar em 1,5% o FPM, passando dos atuais 22,5% para 24%.
Pressão
No dia 30 de agosto, orientados pela CNM, os gestores potiguares aderiram ao movimento: “Mobiliza Já: Sem FPM, não dá!”, como forma de exigir o apoio de parlamentares federais para a aprovação da PEC do FPM e, ao mesmo tempo, pressionar o Governo Federal por mais recursos.
Prefeitos e prefeitas se reuniram na Assembleia Legislativa. Levaram faixas e cartazes. Reclamaram da crise que afeta os municípios e reafirmaram que a única saída é o aumento nos valores do FPM, principalmente para as prefeituras de menor porte, com cota 0.6. Essas prefeituras sobrevivem exclusivamente de repasses da União, uma vez que praticamente inexistem meios para arrecadação própria.
No caso das cidades que tem arrecadação própria oxigenada, a reclamação da queda de FPM precisa ser justificada de forma clara, transparente, coisa que não ocorre. A Prefeitura de Mossoró, por exemplo, fechou as portas para protestar contra a queda do PFM, mas, segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional, o município aumentou essa fonte de receita.
No último levantamento feito pelo Jornal de Fato, sem adicionar a terceira cota do FM de agosto, entre janeiro e agosto de 2023 a Prefeitura recebeu R$ 105.633.430,23 do Fundo, contra o volume de R$ 102.078.423,51 repassado no mesmo período do ano passado. Ou seja, o acumulado de 2023 tem saldo positivo era de R$ 3.566.006,75.
Mesmo assim, o gestor municipal continua com discurso de crise financeira, culpando a “queda” no repasse do FPM como uma das razões para a crise financeira.
Royalties em queda é “arma” para pressionar governo central
Os prefeitos de municípios produtores de petróleo incluem na reclamação a queda nos repasses dos royalties que são transferidos pela Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP). Os gestores acreditam que a redução nessa fonte de receita também serve de pressão para acelerar em Brasília a aprovação da PEC que aumenta em 1,5% o Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
De fato, entre janeiro e agosto deste ano, os royalties tiveram queda de mais de 32% na comparação ao mesmo período de 2022. Segundo dados do Tesouro Nacional, nos oito meses de 2022, os municípios do Rio Grande do Norte receberam R$ 352,5 milhões em royalties, com valores corrigidos. No mesmo período em 2023, foram R$ 239,1 milhões, o que representa uma queda de R$ 113,4 milhões.
A Federação dos Municípios do Rio Grande do Norte (FEMURN) informou que o repasse de agosto foi 49% menor que o valor do mesmo mês no ano passado. “Em Macau, a queda foi de 61%. Não tem como o município ter um planejamento das suas ações administrativas com uma queda tão abrupta. Isso é muito preocupante para os gestores”, afirma o presidente da Femurn, Luciano Santos, que é prefeito de Lagoa Nova.
No entendimento de Santos, a queda dos royalties pressiona o Governo Federal para reajustar o Fundo de Participação dos Municípios, decorrente da repartição de tributos federais com os municípios.
Confederação prepara nova mobilização em Brasília
A Confederação Nacional de Municípios (CNM) está se mobilizando para levar os prefeitos e prefeitas para Brasília no início de outubro. Entre os dias 3 e 4, a entidade espera concentrar o maior números gestores na capital federal para defender pautas junto ao Congresso e Governo Federal, com a finalidade de aliviar a crise que afeta os municípios brasileiros.
A decisão de organizar esse encontro foi tomada de forma unânime durante a reunião do Conselho Político da CNM. Os líderes municipais estão preocupados com a situação econômica e financeira de diversas cidades, em grande parte dependentes do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
O presidente da Federação dos Municípios do Rio Grande do Norte, Luciano Santos enfatiza a gravidade da situação e apresenta dados que ele considera alarmantes.
“Para deixar absolutamente claro, com base no Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação (Siope), disponível para todas as pesquisas, o custo mensal por aluno, por exemplo, no município de Riacho da Cruz, coeficiente 0.6 de FPM, era de R$ 446,76 em 2021. Em 2023, esse custo deu um salto triplo para R$ 1.035,52, representando um aumento percentual de 131,78%.”
Ele segue: “No que diz respeito à saúde, utilizando o município de Itajá como exemplo, que possui coeficiente 0.6 de FPM, em 2021, o custo mensal por habitante era de R$ 46,98. Já em 2023, até agora, o custo mensal por habitante é de R$ 87,35, segundo informações disponíveis no Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (Siops). A variação percentual desse tipo de custo para o município de Itajá foi de 85,93%.”
“Isso ocorreu em apenas dois anos. Se considerarmos outros indicadores, encontraremos informações igualmente preocupantes, ou até mesmo mais severas, dependendo do município, setor e insumo utilizado para o cálculo”, afirmou Luciano Santos.
“A expectativa é de que o encontro em Brasília reúna prefeitos, vereadores e representantes municipais de todo o país em prol de soluções que possam amenizar a difícil situação financeira enfrentada pelos municípios e, assim, melhorar a qualidade de vida de milhões de brasileiros.”