Cirurgias eletivas estão suspensas há nove meses porque a Prefeitura de Mossoró não pagou aos hospitais credenciados. A doméstica Helena Alves, residente no bairro Aeroporto, relata que venceu seu único transporte para custear despesas de cirurgia
Da Redação do Jornal de Fato
A doméstica Helena Alves, residente no bairro Aeroporto, zona oeste de Mossoró, teve que vender seu único transporte, uma Honda Biz, para custear as despesas de uma cirurgia de vesícula a que se submeteu no dia 14 de julho.
Ela é uma das dezenas de pacientes do Sistema Único de Saúde afetadas pela suspensão de cirurgias eletivas no município, consequência da falta de pagamento da Prefeitura aos hospitais credenciados.
“Sou uma doméstica, e o único transporte que eu tinha era uma bizinha. Eu vendi para fazer minha cirurgia. Eu estava com minha vesícula estrangulada e hoje preciso fazer outra cirurgia”, contou Helena em entrevista ao blog do jornalista Ismael Sousa. “Eu tento fazer uma histerectomia desde 2022 e não tenho mais o que vender. Isso é uma vergonha”, afirmou, ao revelar que pagou em torno de R$ 7 mil a um hospital particular pela cirurgia de vesícula e medicamentos.
O caso de Helena Alves ilustra a crise na saúde pública do município, revelada por uma série de reportagens publicada pelo Jornal de Fato nas últimas edições. O cenário contrasta com os gastos da gestão do prefeito Allyson Bezerra (União Brasil) com as festas em praça pública. Estima-se que só o Mossoró Cidade Junina 2025 custou em torno de R$ 50 milhões, inclusive, pagando cachês acima de R$ 1 milhão, de forma antecipada, como foi o caso do cantor forrozeiro Wesley Safadão. Depois do Cidade Junina, a Prefeitura realizou o Mossoró Sal & Luz e a Festa do Bode.
Enquanto isso, a saúde virou um caos. Na semana passada, servidores das três Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs) denunciaram que a empresa contratada para realização de exames laboratoriais havia lacrado os aparelhos por falta de pagamento. O Jornal de Fato constatou que os equipamentos foram lacrados e o serviço, suspenso.
A Secretaria de Saúde, por meio de nota, confirmou que a empresa não estava mais oferecendo os serviços, negou falta de pagamento e afirmou que os exames estavam sendo realizados por outras empresas contratadas.
Os problemas nas UPAs, relatados pelo Jornal de Fato, motivaram o Conselho Municipal de Saúde, por meio do conselheiro Luiz Avelino, a tornar público que as cirurgias eletivas estão suspensas há nove meses por falta de pagamento.
As informações da Central de Regulação indicam que a lista de espera, que contava com 793 solicitações em janeiro deste ano, já ultrapassa a marca de mil procedimentos pendentes. Com o intuito de reduzir essa fila de espera, Luiz Avelino informou que o Conselho Municipal tentou dialogar com a Secretaria Municipal de Saúde para que fosse realizada uma força-tarefa com várias cirurgias.
A interrupção das cirurgias foi motivada pela suspensão dos repasses financeiros da Prefeitura de Mossoró às instituições prestadoras de serviço, como a Liga de Mossoró, o Hospital São Luiz e a Associação de Proteção e Assistência à Maternidade e à Infância de Mossoró (APAMIM), que realizavam esses procedimentos.
O colegiado apresentou ofício ao Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) denunciando a suspensão das cirurgias eletivas ginecológicas no município desde novembro de 2024. O caso está com a 1ª Promotoria de Justiça da Comarca.
Prefeitura perde recursos federais para cirurgias
A vereadora Marleide Cunha (PT) denunciou nesta terça-feira, 12, que o município de Mossoró perdeu parte dos recursos federais destinados a cirurgias eletivas no Sistema Único de Saúde (SUS). Isso ocorreu por falta de execução por parte da gestão do prefeito Allyson Bezerra.
Em suas redes sociais, a vereadora escreveu:
“O Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (COSEMS), com aprovação da Comissão Intergestores Bipartite (CIB), pactuou junto ao Governo Federal quase meio milhão de reais exclusivamente para a realização de cirurgias ginecológicas e outras eletivas em Mossoró.
No entanto, por falta de execução por parte da Prefeitura, R$ 115 mil já foram redistribuídos para outros municípios – e nenhuma cirurgia foi realizada até o momento.”
Marleide afirma que “é inadmissível que mulheres estejam em risco de morte, enquanto recursos destinados à saúde seguem parados ou sendo perdidos.”
Segundo a vereadora, se a gestão Allyson Bezerra não adotar providências até setembro, mais de R$ 325 mil poderão ser devolvidos, “prejudicando diretamente quem mais precisa de atendimento.”